A Fenda (Poema, 2019)

A Fenda
Dennis Zagha Bluwol,  2019

No centro de toda existência
Reside uma fenda.
É ela que nos irmana.
A fenda é a face do abismo.

O abismo a tudo suga, a tudo engole, a tudo aniquila.
Ao desespero em se tentar encobrir a face do abismo,
Fardo imposto àqueles para os quais a consciência fora imposta,
Chamamos “vida”.

Pode-se tentar cobrir a face do abismo com beleza,
Mas a beleza será sugada.
Pode-se tentar cobrir a face do abismo com nobreza,
Mas também ela será tragada.

Do fundo do abismo ressoam ecos:
São vozes de instantes outrora devorados,
Entre instantes mortos e instantes a morrer,
Implorando à fenda pelos ecos que virão.

Se nosso eco pela eternidade ressoará
Ou se o silêncio finalmente reinará,
Se o tempo, ele mesmo, vier a colapsar,
Eis um mistério a suportar.

No interior da fenda, duas opções:
O Nada existir ou o Tudo residir.
Fora da fenda, o pai dos mistérios
Perturba-nos o espírito e o convoca a decidir.

Se o fundo do abismo for o cume real
E nosso Norte um erro de direção,
Todo ódio e todo amor sucumbidos
No fundo do abismo unir-se-ão.

E no vazio primordial,
Agora em comunhão,
Pela eternidade
Novos cosmos originarão.

Mas se o fundo do abismo for apenas chão,
Séculos e instantes não mais surgirão:
Todo o tempo será tragado
E todos os ecos silenciarão.

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