Contribuições para a redefinição das origens do pentecostalismo (Pseudohistória, 2013)


CONTRIBUIÇÕES PARA A REDEFINIÇÃO DAS ORIGENS DO PENTECOSTALISMO (2013)

Introdução
A busca pela origem é um definidor daquilo que podemos chamar de humano, de propriamente humano, de genuinamente humano, de inescapavelmente humano. Todo humano – que se preze e que não se preze – é um buscador de origens.
Buscamos aqui as origens históricas e teológicas do movimento pentecostal no âmbito do protestantismo cristão.
Nem sempre a historia do mundo humano surge no passado. São incontáveis os casos em que a historia surge no instante em que a mente é fecundada pelo encontro com documentos. A historia do pentecostalismo, movimento religioso impressionantemente crescente, pode neste momento ser reescrita graças ao encontro com o precioso texto “Orai Altíssimo” do bispo mexicano Carlito Melendez Jr., datado de 1878 – mais de duas décadas anterior ao início outrora reconhecido para tal movimento em terras estadunidenses.
É sobre esta história que o presente artigo se deterá.

A Origem 
É bem sabida e comentada a relação entre os termos “tradutor” e “traidor”. Contudo, a traição não é apenas uma deterioração. É, ao mesmo tempo, uma criação. Recria o mundo.
No caso da origem do movimento pentecostal, há um destes casos. Durante toda a época da colônia espanhola e após, diversos textos católicos e protestantes aportaram no Novo Mundo. Nas últimas décadas do século XIX, o pacato intelectual cristão Carlito Melendez Jr. dedicava-se incansavelmente ao estudo destes textos. Eis que então, entre eles, descobrira, em uma série de libretos traduzidos pela Sociedade Cristã Mexicana, a repetida aparição da expressão “orai altíssimo”.
Era, hoje sabemos por comparação com os documentos originais, uma tradução equivocada para a expressão “orai ao Altíssimo”.
O constante encontro com a ideia levou o honesto buscador a um profundo insight: para alcançar a Deus, é preciso orar altíssimo.
De início, isto gerou estranheza, pois estava acostumado com o silêncio dos ambientes monásticos e clericais. Porém concluiu que deveria apegar-se mais aos textos clássicos, historicamente sobreviventes, do que às práticas humanas, deturpadas pelo tempo e pelos interesses momentâneos das comunidades eclesiásticas.
Anunciou pois, em uma missa dominical, a mensagem que o chegara: “é pelo grito que se alcança ao Senhor”, seguida de seu primeiro esforço exegético: “pois Ele está muito acima de nós”.
Sua audácia e convicção profunda no que lhe fora revelado rendeu-lhe uma excomunhão. Mas, por outra ironia do destino, foi este o pontapé que precisava para montar sua própria igreja, na Cidade do México. De início não passava de um pequeno quarto, mas, com o tempo, tornou-se um verdadeiro império. Não que tenha aberto filiais, mas seu ponto de partida teológico fora responsável pela abertura de uma infinidade de irmandades seguidoras de seus princípios, de sua abordagem e de seu modelo de culto.
Nas “Notas sobre a Fé” de Carlito é possível ler seu manifesto “Orai Altíssimo”, que sumariza sua visão sobre a oração e, por conseguinte, sobre o culto (servindo de base para todas as igrejas posteriores e explicando a origem de seus modos de ser):

Deus, mestre poeta, rei das imagens, Senhor dos sentidos. Ele, possuidor de todos os sentidos. Nós, buscadores de algum. Altíssimo, termo de sentidos múltiplos; Altíssimo, termo de enorme riqueza com o qual os testamentos se referem ao Criador. Está no altíssimo o Senhor, é no altíssimo o Senhor. Daí que a opinião dos antigos sábios nos diz: “Orai altíssimo!”.
E por que isso se dá?
O espaço entre nós e Deus, o ar, é um véu demoníaco: o elemento que nos separa de Deus, do altíssimo, do que está mais alto. Daí que, após a Queda, passamos a respirar gases, os excedentes materiais das caldeiras infernais. O ser caído vive de ar, preso e oprimido na camada inferior a Deus.
É preciso libertar-se do poder aterrador (que nos aterra) dos gases. O método para tal nos foi dado: a energia espiritual que permite perfurarmos o maligno mar gasoso e atingirmos o agasoso: a fala altíssima, o vulgo berro.
A ciência moderna, como já é de praxe neste incrível momento da história humana em que ciência e espiritualidade finalmente se reencontram, parece provar a existência deste intricado sistema de mundo, pois nos mostra que é nos gases que as moléculas parecem estar em velocidade mais acelerada, em constantes choques. Este caos eterno nunca poderia ser obra do Senhor, em sua magnânima calma e paciência. Deus, portanto, é um deus dos sólidos. Ou melhor, deus é sólido. É firme, constante. Os gases, por outro lado, revelam a perturbação, o demoníaco, a vida em constante conflito, a ausência de paz e a maleabilidade de espírito daqueles que não encontraram a solidez, pagando com uma vida de sofrimento e irritação que, por vezes, leva ao encontro com o suicídio: a entrega final das almas extenuadas.
Sobre os líquidos, contudo, há dúvidas.

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